quarta-feira, 29 de abril de 2009

Dando Bandeira

Aproveito a ocasião para jurar que jamais fiz um poema ou verso ininteligível para me fingir de profundo sob a especiosa capa de hermetismo.Só não fui claro quando não pude(...)
Manuel bandeira - Itinerário de Pasárgada

Desencanto

Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.

A cinza das horas -Teresópolis, 1912

Nietzchiana

- Meu pai, ah que me esmaga a sensação do nada!
- Já sei, minha filha... É atavismo
E ela reluzia com as mil cintilações do Êxito intacto.

Estrela da manhã

Noturno da Mosela

A noite... O silêncio...
Se fosse só o silêncio!
Mas esta queda d'água que não pára!que não pára!
Não é de dentro de mim que ela flui sem piedade?...
A minha vida foge, foge, - e sinto que foge inutilmente!

O silêncio e a estrada ensopada, com dois reflexos
[ intermináveis...

Fumo até quase não sentir mais que a brasa e a cinza em
[minha boca.
O fumo faz mal aos meus pulmões comidos pelas algas.
O fumo é amargo e abjeto. Fumo abençoado, que és
[amargo e abjeto!

Uma pequenina aranha urde no peitoril da janela a teiazinha
[ levíssima.

Tenho vontade de beijar esta aranhazinha....

No entanto em cada charuto que acendo cuido de encontrar o
[gosto que faz esquecer...

Os meus retratos... Os meus livros... O meu crucifixo de
[marfim...

E a noite...

O ritmo dissoluto - Petrópolis, 1921

Bacanal

Quero beber! cantar asneiras
No esto brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco...
Evoé Baco!

Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada,
A gargalhar em doudo assomo...
Evoé Momo!

Lacem-na toda, multicores,
As serpentes dos amores,
Cobras de lívidos venenos...
Evoé Vênus!

Se perguntarem: Que mais queres,
Além de versos e mulheres?...
- Vinhos!... o vinho que é o meu fraco!...
Evoé Baco!

O alfanje rútilo da lua,
Por degolar a nuca nua
Que me alucina e que não domo!...
Evoé Momo!

A Lira etérea, a grande Lira!...
Por que eu extático desfira
Em seu louvor versos obscenos,
Evoé Vênus!

Carnaval,1918

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